Por onde andas? Tu me perguntas como uma flecha em meu flanco.
Ando na crepuscular copa de árvores com ritmos iluminados da fruta-cor.
Ando na sombra dos quintais e na alameda de perdas de um jardim onde me visitam garças no âmbar da tarde.
Ando no ermo da praia e nas ondulações de pontes sobre águas.(a deus ou o diabo dará como uma puta incalculável e bêbada atravessando para outra margem seu resquício de sorte e arte).
Ando nos becos, nos casarões vazios, cortiços e galpões que me abrem no vapor da memória e no silêncio agridoce da noite.
Ando macia pelo chão áspero me esfregando em telhados e paredes de imagens esculturadas por ventos, caracóis com alma de cão e por rios leitosos de meus mamilos que tudo fareja e ama.
Ando por arcabouço em fundo de poço e sarandando na trama da teia.
Ando na casa velha, no terreno de quebrar pedras, percorro telhados onde garças pousam seus brancos silêncios e meninos soltam pipas coloridas no céu azuláceo.
Ando descaminhando na minha cidade de ilhas, águas, pedras, mastigando tuas folhas molhadas no telhado.
Ando no meio das chuvas como densa neblina mergulhando no teu corpo de ilha.
Ando no desatino inesperado do destino.
Ando exausta dos escombros e nas noites em clara-reconstrução.
Ando na embriaguez de longas secas em desertos extensos.
Ando em paredes-silêncios como lesmas que escorrem seu visgo-viço no tempo indomável.
Ando_rinha em verão sozinha fazendo tudo fora de estação.
Ando de ir por aí sem esperança de nada, só, a evolar o silêncio de uma devastação.
Ando no instante incógnita-intrigante e insana nessa vertigem de lodo musgo e lama que é frágil no nume da lâmina nua da aurora.
Ando nos buracos em escavação de meu corpo espáduas escápulas e o sem fundo dos mundos que me escapam. Ando nos troncos e no sol avanço. E onde nascem as árvores.
Ando no mundo e fora do mundo, ando onde não há lugar.
Ando avançando na noite tateando o teu corpo de palavras.
Ando na antecâmara da morte.
Ando suspensa na distância como verbos que não são carne para agora.
Ando nos corredores e esquinas dos labirintos que se multiplicam numa ciranda bárbara.
Ando nos erros de todas as concordâncias e nos absurdos de minha fase gramática.
Ando no fogo da navalha e delicadamente me esquivo do corte.
Ando coiote nas noites que grito.
Ando de rondar o secreto do quarto a lagoa e teu braço-atracadouro de desembarcar cardumes de garças e gaivotas baças.
Ando atravessando os poros da noite como anêmonas bailam trêmulas no teu corpo de ilha espuma areia e seda.
Ando a beira com patas e tênues garras tateando o silencioso gume da língua que brinca no céu da boca.
Ando na multidão de vozes em fervor, nos olhos sombrios agudos e doces dos centauros cornos búfalos e da esfinge mergulhada em seus enigmas.
Ando magmas, criptas e inutilmente ando amor.
“Eu te levo pra casa mesmo embriagada.” Tu me respondes abraçando-me como uma ilharga à flor d'água.