"Minha alma canta sobre a guanabara"
Foi quando desci. Misturada de mangue e cais de Porto. Sobrevoava ainda os céus além mar e chegando a guanabara penetrei o ventre da terra brasileira carioca. Atravessando a ponte rio-niteroir futura. As águas eram toda eu. Cresci amolecida. Subterrânea. Submersa. De barro e mar. Perolada de sal. Vinho bordando as rendas. Mãe vó tias pegavam Caranguejo, rãs e siris metendo a mão no fundo do brejo até as entranhas e lavando os mortos para capela velar na posteridade com missas para mortos de 7 dias 7 anos 7 decadas os setênios todos, estou cravada no 7. Eu já me revirava no ventre de vovó. Siri na lata, imagina só. Pai nos tamancos portugueses, fazedor de casa e já o escorpião estirava cabeça a me espiar por entre as fendas, eu mesma o bicho negro na sombra fabrincando punhais e abismos. Picou-me e contenho veneno e antídoto. Doadora de sangue, engulo cabeças, - vivas! E corpos em êxtase.
Voam sobre a guanabara as almas por vir. Atravessam a ponte e mergulham n'agua. Aportam no cais. Acolho na bacia das almas os fetos mortos. Marinheiros a postos, navegar! Sim. É noite. E névoa. E muitos navios acenam chegada. Farol no mar. Com trilha para montanha e para praia. Chegam os maritmos de África e sua pequena tribo indígena, aldeia de Angola, vem lá. Do Porto. Lisboa. Espanha. Itália. Rússia. E toda máfia. Amada minha, sim! Meu clã. Família , minha! Egito. E toda magia. Peru. Espanha , a ciganagem toda, a corte e os grande conselhos, comigo cá. Habitam-me. Abrigam-me. Abraçam-me.
Braços abertos eu.
Rio de Janeiro, inverno de 2025.
Alessandra Espinola