[o silêncio me procura]
1.
No domingo
a chuva bebeu a terra
era verde pra tudo que é gado.
2.
A água da chuva escorre
pra dentro da areia
oásis no deserto.
3.
De manhã,
o cheiro de sol
tirava traças da gente.
4.
Na rua de lama
eu afundava cinza
crescia um lótus do meu tamanho.
5.
Nunca fiz um caderno de poesias
eram só rabiscos de gastar canetas.
6.
Segredo: quando amanhecia
passava um rio de levar os sonhos para quenturas,
então tudo se vinha mais suave sem explodir nas margens da gente.
7.
Os homens que tem aquele pente-escovinha de colocar no dedo, sabe?
Eles tem a poesia no bolso.
O pai tinha.
8.
Tia Nicinha me colhia estrumes secos nas tardes de sol fresco,
eu guardava aquele cheiro das caminhadas em Campo Grande,
depois na sola dos pés me cresciam abóboras e melancias.
9.
Domingo é dia de garças -
quando cai o manto da tarde elas vão
esperançando a próxima semana.
10.
Fecha as pernas
e vai pentear esse cabelo, menina!
Dizia-me a mãe.
[mas o tempo não cria jeito]
11.
O amor com seus tapinhas
tem vez, me acerta os rins...
é amor de mau jeito.
12.
Silêncio é canção no verde das folhas
e me amacia com a terra depois das chuvas.
13.
Existem vários gestos de silêncio
Agora.
Escrevo.
14.
Gosto de escrever com canetas
que a tinta é sugada pelo papel.
Um ponto vira mundo.
E se chorar desmancha.
15.
Silêncio visitava a casa
som da chuva
no telhado.
16.
Silêncio:
manguezal
amanhecido de garças.
17.
no escuro da rua
o escorpião
me corpeia
18.
na solidão
da lagoa silencia o sol
à tarde
19.
as chuvas de maio
me movem
para dentro
20.
realizo-me à casa
tudo lá fora
fantasia
21.
na praia à tarde
o pensamento
me onda
22.
tanta chuva
encheu de ilha
minha solidão
23.
ilhada a garça
solidão
enchia o mangue
24.
bola no manguezal
esperança de menino
ia longe
25.
garças
pousam no silêncio
de depois da chuva
26.
de ilhas e chuvas:
[minha] cidade
debaixo d'água
27.
em banho-maria
o tempo
as coisas no tempo
28.
sobre a mesa
os papéis
soltos
29.
esses crisântemos
no caminho
lembro-me de ti
30.
estrela que cai
mais uma
no varal do céu
31.
depois da chuva
a lua na poça
repousa
32.
coqueiros na praia
ondulados
de saudades
33.
a venda do seo manel
cheirava a doce de leite
e papel de pão
34.
os meninos
na porta da escola
seguravam o cair da tarde
35.
fora de estação
o outono dentro
da fruta
36.
à noite
a lagoa plaina
na asa de uma gaivota
37.
quem viaja?
eu ou o tempo em mim
melhor escafandrar como!
38.
manhãs de saigon
a gata me pula do peito
com garras e olhos de brasa
vida é fogo e faca!
39.
varanda
folhada de dúvidas
escondem os frutos?
40.
na varanda
o silêncio se espreguiça de sombra
ou se dependura no varaluz
41.
é só jogar
sal no sapo:
ele sai do canto
42.
lagarto
se finge
na beira da tarde
43.
lagarto
empredra silêncio
na lápide
44.
arco-íris na estrada
ponte de formiga
sem asa
45.
azaléia
no vaso na mureta de azulejo
a mãe alisava
46.
araçás
na beira do mangue -
cobertos de garças
47.
no escuro
só escuto
a cigarra gritar
48.
o dia tarde finda
na curta fenda da noite
é verão!
49.
na neblina da manhã
o sol e a saída se escondem
menos o canto da ave ao longe...
50.
na casa velha
o som do canivete
raspando a ponta do lápis
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neste mundo
ResponderExcluiraflita a vida vai passando
e logo se cansa...
PALAVRA INCERTA
ResponderExcluirvale a pena dizer
não sei o que dizer
e já sei dizer
alguma coisa
contudo o entrudo
festejado no Carnaval
tem um mascarado
a ostra aberta
mostra uma pérola
uma palavra (in)certa
Certa é a certeza de agradecer a beleza, te poder ler! Beijos
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirPeguei aqui emprestadas, umas palavras tuas.
ResponderExcluirSe você não autorizar, avisa que deleto.
M* e todo mundo: Peguem quantas e quais quiserem, façam amor com elas, todas as minhas palavras vos amam! se as minhas palavras pegaram vc para um vôo voe então pra onde quiserem e assim é bom, não é? É sim! Eu é que agradeço a atenção e por vc me levar junto pra um mundão de beleza que é o seu. Beijos!
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